Anderson Melo critica prosseguimento do jogo e não sabe quando volta
Jogador sofreu ataques homofóbicos na última etapa do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia
Quando fez o post nas redes sociais que denunciava os ataques homofóbicos sofridos na última etapa do Circuito Brasileiro de Vôlei de Praia, há pouco mais de uma semana em Recife, Anderson Melo não esperava o tamanho da repercussão do caso. “Não sei se vão ler meu texto todo por não ser um atleta conhecido mundialmente, não sei se serei ouvido como gostaria”, escreveu na ocasião.
Mas, impulsionado pelo apoio recebido de outros atletas e personalidades, além do público em geral, o caso viralizou nas redes sociais, apareceu na mídia e a cobrança por providências pressionou a Confederação Brasileira de Vôlei, organizadora do torneio, que inclusive é cobrada por Anderson e outras pessoas pela não intervenção imediata.
Mesmo que logo após a partida em que os ataques criminosos aconteceram a CBV tenha passado a veicular no início das partidas na quadra principal do torneio uma mensagem de repúdio a atitudes preconceituosas, e tendo mobilizado atletas e árbitros com faixa de apoio ao atleta e combate a homofobia nas partidas finais do torneio, a confederação não explicou na nota oficial emitida na época porque não interveio durante a partida, quando as agressões estavam acontecendo (procurada pelo Veja a entidade se pronunciou a respeito – leia abaixo).
Em bate-papo exclusivo com a coluna o atleta conta que apesar dos ataques acontecerem desde o início da partida a “ficha caiu” no intervalo entre o primeiro e segundo set, quando um outro atleta chamou a atenção para o que estava acontecendo. “O Leo Vieira entrou na quadra, bateu nas minhas costas e falou pra eu parar o jogo porque já tinha passado de todos os limites”, lembra Anderson.
Ele imediatamente procurou a árbitra que sinalizou que já estava incomodada com o que vinha acontecendo mas afirmou que precisava de uma reclamação oficial do jogador para tomar providências. Ela então chamou representantes da organização mas deu prosseguimento a partida, mesmo com os ataques continuando.
“Eu acreditei que conseguiria seguir no jogo e que eles iriam acabar com aquela situação. Mas, mesmo com inicialmente os ataques diminuindo, toda vez que o placar ficava mais próximo eles voltavam a me agredir verbalmente”, descreve Anderson que critica os organizadores que passaram a acompanhar a partida após solicitação da arbitragem e nada fizeram com os torcedores que proferiram os ataques homofóbicos. Mas faz uma ressalva importante: “Não só a organização, mas qualquer pessoa poderia ter chamado a polícia. Eu estava dentro de quadra mas estava perdido, era só meu corpo ali. Já não pensava, não fazia nada”.
Em resposta aos questionamentos do colunista, a CBV afirmou que solicitou reforço na segurança, com a presença de dois representantes da Guarda Municipal e que no fim do segundo set, quando foi possível novamente ouvir ofensas vindas da arquibancada, “nem a árbitra e nem os integrantes da Guarda Municipal presentes conseguiram identificar os autores”.
A confederação afirmou ainda que prestou queixa e procedeu com o devido registro de ocorrência na Delegacia de Polícia da 7ª Circunscrição, em Boa Viagem, encaminhou o ocorrido ao Ministério Público local e ao Superior Tribunal de Justiça Desportiva do Voleibol, para que sejam tomadas todas as medidas legais cabíveis. Em resposta por e-mail o Departamento de Comunicação da entidade afirma ainda que “a CBV acompanhará os desdobramentos do caso e não medirá esforços para que os responsáveis sejam identificados e punidos”.
O atleta afirma que teve uma conversa longa com a Confederação Brasileira de Vôlei que ofereceu suporte psicológico, mas preferiu seguir com a terapeuta que já o acompanha. Mesmo assim ele ainda está passando pelo processo de recuperação. “Eu ainda fiz dois jogos na etapa na sequência sem condições psicológicas. Os gritos da torcida, mesmo a favor, já estavam me assustando. Voltei a treinar na semana passada, mas até agora não consegui jogar vôlei. Tenho que me recuperar psicologicamente e fisicamente porque na próxima semana tem competição. Estou lutando pra ver se consigo jogar, mas ainda não é certo.”, explica.
Anderson também é a favor que a Confederação Brasileira de Vôlei crie um protocolo para que situações similares não aconteçam. “E se acontecer que saibam como agir rapidamente, que não foi o que aconteceu”, completa. Segundo ele, a Comissão de Atletas de Vôlei, que o apoia desde o fato, propôs que a entidade faça uma reunião com árbitros para que saibam o que fazer nesses casos. “O que me foi dito é que o árbitro só pode tomar uma atitude a partir da vítima se posicionar. Mas questionei se estivesse apanhando dentro de quadra se eles só agiram se eu gritasse por socorro”, finalizou.
A entidade por sua vez afirma que organizará reunião com atletas, comissão de atletas e árbitros para avaliar aprimoramentos no regulamento da competição, e incluir penalizações para casos de atos discriminatórios em competições de vôlei de praia; realizará reuniões presenciais e remotas para reforçar os procedimentos que devem ser adotados por árbitros, delegados técnicos e atletas durante as etapas do Circuito Brasileiro de vôlei de praia adulto e de base; e que durante as próximas etapas de vôlei de praia, o alerta de que a prática de atos discriminatórios configura crime será lido antes de jogos na quadra central e nas quadras externas.