Marie Bèndelac: o esgotamento silencioso dos CEOs
Eu diria que a força de um líder não está em resistir ao cansaço, mas em reconhecer quando ele chega
Alguns anos atrás, acompanhei o diretor de um grupo multinacional que já havia infartado duas vezes. Quando começamos o processo de coaching executivo, ele estava prestes a ter o terceiro.
Um homem muito inteligente, extremamente dedicado, admirado por todos — mas completamente desconectado de si mesmo e de suas emoções.
Ele se cobrava mais do que qualquer pessoa jamais o cobrara. Não tirava férias, dormia pouco e acreditava que parar era sinônimo de fraqueza. Durante o processo, começou a mudar.
Pela primeira vez, entendeu que o problema não era o cargo nem a pressão externa — era o modo como se relacionava com o próprio desempenho e seu altíssimo nível de autocobrança.
Ele se enxergava como uma máquina, não como um ser humano. No fim daquele ano, não apenas tirou férias duas vezes, como também foi promovido dentro do grupo.
Outro caso que me marcou foi o de uma vice-presidente de uma multinacional no Brasil — uma mulher incrível que dormia com o celular e o laptop debaixo do travesseiro. Ela estava à beira do burnout.
Por ter sido promovida num ambiente predominantemente masculino, sentia que precisava provar o tempo todo que merecia estar ali. Trabalhava sem pausas, vivia em estado de alerta constante, sempre pronta para responder a qualquer mensagem, a qualquer hora.
O que ela não percebia é que o esforço para se provar era justamente o que a afastava daquilo que a tornava única: sua lucidez, sua sensibilidade, sua presença.
Essas histórias são mais comuns do que se imagina.
Por trás dos relatórios impecáveis e dos resultados expressivos, há um número crescente de líderes exaustos, solitários e desconectados de si mesmos.
Segundo a Harvard Business Review (2024), 25% dos CEOs relatam solidão frequente e 55% afirmam viver episódios significativos de isolamento.
O topo é um lugar onde poucos compreendem as pressões que se enfrentam. O executivo precisa manter a serenidade enquanto todos esperam respostas. Mas quem cuida de quem lidera?
Na minha experiência, o que mais pesa não é a carga de trabalho, mas o silêncio emocional — o não poder demonstrar dúvida, o não poder falhar, o não poder dizer “hoje eu não estou bem”. É a cobrança de inspirar os outros mesmo quando se está exausto e precisando de inspiração também.
No Brasil, uma pesquisa da Deloitte e da Forbes Brasil (2024) revelou que 62% dos C-levels já enfrentaram burnout. E, segundo a Ipsos (2025), 52% dos brasileiros consideram a saúde mental o maior problema de saúde do país.
Esses números dizem muito sobre o momento que estamos vivendo. Estamos diante de uma epidemia silenciosa de exaustão emocional — e ela não escolhe cargo nem nível hierárquico.
O que mais adoece, muitas vezes, não é o trabalho em si, mas a crença de que é preciso dar conta de tudo, ser forte e estar disponível o tempo todo.
Vejo executivos brilhantes que nunca tiram férias, que não sabem mais relaxar, que trocam descanso por planilhas e silêncio por reuniões. E quando o corpo fala, às vezes já é tarde — e custa caro para todos.
Minha experiência nos últimos quinze anos, acompanhando e desenvolvendo líderes, confirmou que existe outro caminho. Liderar não precisa ser sinônimo de carregar o mundo nas costas. É possível performar com consciência, com presença e com saúde. Eu mesma já estive à beira do burnout algumas vezes ao longo da minha carreira.
O que me salvou — e já ajudou milhares de executivos — foi a Comunicação Não Violenta (CNV).
Desenvolvida pelo psicólogo americano Marshall Rosenberg, é muito mais do que uma ferramenta de relacionamento e comunicação: é uma filosofia de vida que potencializa a inteligência emocional e a resiliência.
Ela nos ensina a reconhecer nossas emoções e necessidades antes que elas se tornem urgências. A falar com clareza, sem dureza. A ouvir com empatia, sem absorver o peso do outro nem se deixar manipular. A colocar limites saudáveis — inclusive para nós mesmos — e a criar conexões verdadeiras, que favorecem a saúde mental.
Quando um líder aprende a se comunicar a partir da consciência — não da culpa nem do medo — tudo muda. Equipes se tornam mais saudáveis, decisões mais equilibradas e resultados mais sustentáveis. A CNV ajuda executivos a performar sem adoecer e a liderar sem se sentir tão sozinhos.
Afinal, o verdadeiro sucesso não é apenas chegar ao topo — é chegar inteiro e se manter. Empresas são feitas de pessoas, e nenhuma estratégia é capaz de prosperar se quem conduz está em colapso.
Eu diria que a força de um líder não está em resistir ao cansaço, mas em reconhecer quando ele chega. E, a partir daí, escolher outro caminho: o da consciência, do equilíbrio e da verdade.





