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As donas da bola para o alto nas areia do Leme

Mulheres dominam a praia e revelam destreza na altinha, esporte que ganha escolinhas, campeonato e projeto social

Por Pedro Landim
18 out 2024, 06h00
Patrimônio carioca: criada nos anos 1960, a altinha virou tema de documentário
Patrimônio carioca: criada nos anos 1960, a altinha virou tema de documentário (Olivia Moreth/Divulgação)
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Os ataques de tubarão têm sido constantes, com as ocorrências concentradas à tarde, quando o sol começa a se pôr descortinando um belo cartão-­postal na Praia do Leme. Mas que ninguém se assuste. O shark attack, neste caso, é um salto acrobático para atingir a bola no alto com a sola do pé, muito comum no futevôlei e que anda dominando as rodas de altinha — modalidade que conquistou esse trecho de areia. Dezenas de rodinhas se formam diariamente por ali, transformando a paisagem no entorno da barraca Rasta Beach, em frente ao Posto 1, num estádio a céu aberto, onde a presença feminina só faz crescer. “As areias do Leme são palco de integração e diversidade, e a altinha tirou as meninas da arquibancada”, comemora a professora de educação física Lorena Bichucher, 32 anos, que criou em 2022 a EmpoderAlta, a primeira escola do gênero para mulheres.

E a iniciativa tem rendido muitos frutos. A escolinha já conta com cerca de sessenta alunas, que começam aprendendo a se movimentar na areia, um terreno novo para a maioria, que envolve trabalho para aprimorar os reflexos. Seguem repetições em dupla com a bola, botando ombro, coxa e cabeça em ação. No nível avançado, ataque e defesa são treinados em roda, o que abrange lances como o escorpião, em que a bola passa por cima da cabeça e é atingida com o calcanhar levantado. “Não há contato físico nessas rodas, algo importante para elas, que assim ganham confiança e empoderamento”, avalia Lorena, à frente também do Jogue Alta, Sonhe Grande, projeto social voltado para a ala feminina de comunidades próximas como Babilônia e Chapéu Mangueira.

As alunas da EmpoderAlta: primeira escolinha para o público feminino
As alunas da EmpoderAlta: primeira escolinha para o público feminino (André Arruda/Divulgação)

Jogadas ensinadas e lapidadas nas areias cariocas são exibidas no recém-lançado documentário Bola pro Alto!. De observadora do esporte a praticante e pesquisadora, a cineasta e atriz Cecília Lang rodou durante cinco anos o filme, aplaudido recentemente em um festival de Nova York. “A altinha é um fenômeno popular e inclusivo, que tomou o Brasil e se espalha mundo afora”, observa Cecília. “Mais do que um jogo, é um estado de espírito, de bem-estar”, resume. Declarada patrimônio cultural imaterial do Rio, a modalidade surgiu em Ipanema nos anos 1960, baseada na adaptação dos fundamentos do futevôlei para a prática em círculo, mantendo a bola sempre no alto — daí o nome. “Jogar futebol na praia era proibido, então foi preciso usar a criatividade e se adaptar. Mas naquela época não havia tantas jogadas nem a presença de tantas meninas como hoje”, lembra o músico e ator Evandro Mesquita, que participou do filme de Cecília Lang, junto com a nutricionista Cynthia Howlett, outra entusiasta adepta.

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De puro entretenimento, a história foi ficando séria e virou competição. Lá pelos anos 2010, vieram os primeiros campeonatos, hoje com direito a liga nacional e etapas pelo Brasil. Inúmeros movimentos foram criados valendo ponto, como as manobras do surfe. As equipes de quatro pessoas incluem, no mínimo, uma mulher, e o grupo se apresenta por cinco minutos aos jurados. Justamente no Leme emergiu um dos melhores times do país — o Chileme, campeão do circuito em 2023. Moradora do Recreio, Carolina Garcia, a integrante feminina do quarteto, chegou à liderança do ranking brasileiro de atletas (incluindo os homens) e ostenta uma coleção de mais de vinte títulos, entre altinha e futevôlei. Por essas e outras, não há dúvida: a praia é delas.

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